sábado, 13 de junho de 2009

Santo Amaro


As contradições e os séculos de história de Santo Amaro
A área, que tem seus primeiros registros datados do século 16, cresceu, já foi município e, de volta à propriedade da Capital, se multifacetou. A história permanece viva com os moradores, que falam com orgulho da terra.
O "mar de barracas" que se instala no centro histórico Santo Amaro é um caleidoscópio, cujo ponto focal pode ser um quadro do artista plástico santo-amarense Júlio Guerra, produzido nas primeiras décadas do século passado, que retrata um mercado velho, o Largo 13 de Maio e a Igreja de Santo Amaro, com pessoas languidamente nas ruas de terra ou em cenas de enterro, como se as horas não passassem.
O tempo passou, o distrito cresceu, se multifacetou, mas a história permanece viva junto aos moradores nascidos ali e que falam com orgulho da terra. E não há como entender Santo Amaro deixando a história para trás.
No início, século XVI, era uma aldeia de índios Guaianases, chefiada pelo cacique Cayubi. A chegada dos portugueses a São Paulo deu início ao processo de miscigenação na região: em 1560 a índia Terebê, considerada a avó de Santo Amaro, casou com um português.
Os portugueses também foram responsáveis pela denominação de Santo Amaro, quando, naquele mesmo ano, o casal João Paes e Suzana Rodrigues, que morava numa chácara, doou uma imagem do santo ao povoado, e que foi instalada numa capela no ponto mais alto da região, conhecido como Largo da Bola, posteriormente Largo 13 de Maio, onde efetivamente começou o vilarejo.
Séculos depois, em 1832, foi elevado à condição de município, com a criação da Câmara Municipal de Santo Amaro. Permaneceu como cidade até 1935, quando foi incorporada ao município de São Paulo, abrangendo uma área territorial que incluía Cidade Ademar, Parelheiros, Capela do Socorro, M´Boi Mirim, Brooklin, e que totalizava 614 quilômetros quadrados.
Prosperidade
Como pólo central na Zona Sul da cidade, teve uma prosperidade constante, com a instalação de diversas indústrias por imigrantes europeus, chegando a responder por 50% do recolhimento de impostos nos anos 70, segundo dados da subprefeitura. A concentração dessas empresas era na região de Jurubatuba, cortada pela avenida das Nações Unidas.
Hoje, a área ocupada pela subprefeitura é menor do que a que formava o município, abrangendo os distritos de Campo Belo, Campo Grande e Santo Amaro. A exemplo de outras regiões de São Paulo, a subprefeitura sofreu esvaziamento das indústrias, atraídas para o interior, e desenvolveu o setor de comércios e serviços, principalmente na Chácara Santo Antônio.
Ocupação do solo
Mas a redução territorial, na prática, parece não ter acontecido, visto que Santo Amaro continua concentrando as pessoas da periferia Sul que vão procurar emprego ou estão simplesmente de passagem. As distorções sociais são percebidas principalmente no mar de barracas de ambulantes com seus toldos azuis que tomam conta do centro histórico, e em 43 favelas distribuídas pela região. A ocupação correta do solo urbano é um dos principais desafios da subprefeitura, que está adotando medidas como a criação de um Centro de Comércio Popular (POP), para atender a essas pessoas que vivem na economia informal.
As ações do Poder Público para melhorar o funcionamento do território da subprefeitura contemplam ainda operação tapa-buracos, poda de árvores, limpeza de bueiros e boca de lobo, intensificação da varrição, reformas de praças e a retomada de pelo menos duas obras de porte: a construção das alças da ponte na Avenida Roberto Marinho, próxima à Avenida Nações Unidas, e do Complexo Viário do Jurubatuba, com duas pontes e duplicação da Avenida Miguel Yunes.
Alto padrão
Em contraponto à atmosfera tipicamente popular do centro histórico de Santo Amaro, casas de alto padrão estão encravadas em bairros de luxo como Chácara Flora, Granja Julieta, Jardim Petrópolis e Alto da Boa Vista. Na Chácara Santo Antônio, multinacionais da área de tecnologia ocupam diversas áreas, estimuladas pelo preço mais baixo do que em outros bairros nobres da cidade. Segundo dados da associação de moradores, o valor por metro quadrado na chácara é de R$ 2.300,00, abaixo dos R$ 4 mil cobrados no Morumbi, por exemplo.
Essas multinacionais, como Philips, Oracle, Pfizer, Deustche Bank e Schering do Brasil, começaram a chegar há cerca de 10 anos e deram um perfil moderno ao bairro, que entre os anos 30 e 50 fora industrial, impulsionado por firmas têxteis. As multinacionais impulsionaram a construção de condomínios residenciais e de seis hotéis de porte, como o Transamérica e o Melià. A Chácara conta também com a Câmara Alemã de Comércio, Câmara Americana de Comércio, três prédios da Universidade Paulista e vai receber instalações da Uniban (Universidade Bandeirante de São Paulo).
Com forte presença de imigrantes europeus, como alemães, portugueses, italianos e, mais recentemente, de americanos, o bairro registra a presença de 15 a 20 mil moradores e público flutuante de 40 mil pessoas, o que totaliza um fluxo de 60 mil pessoas diariamente, segundo dados da associação de moradores.
O que em princípio demonstra a vitalidade e dinamismo da Chácara Santo Antônio, na prática também acarreta problemas à comunidade. “Hoje, as áreas comerciais e residenciais se misturam. E não temos identidade de ser residencial e comercial”, afirma Adilson Almeida Araújo, diretor institucional da Associação Chácara Santo Antônio, empenhada em manter o ordenamento e a qualidade de vida local em meio ao progresso.
Atuação de entidades
O temor da associação é que as condições do trânsito piorem e prédios históricos possam ser derrubados para dar lugar a empreendimentos imobiliários, como estacionamentos. Por isso que as reivindicações da entidade são para melhoria no tráfego e no quesito segurança, com aumento do contingente da Polícia Militar. Os representantes da associação também lutam para obter uma área de lazer, melhorias no calçamento e asfaltamento e ampliação do posto de saúde.
A atuação das entidades, por sinal, é uma marca nos bairros da subprefeitura. No Jardim Cordeiro, que integra o Jardim Petrópolis, no chamado Brooklin Velho, a associação local concentra muitas de suas ações na área ambiental. É uma forma de analisar Santo Amaro como integrada ao território mais amplo da Zona Sul, onde os danos ou benefícios atingem tanto ao morador da periferia como da área nobre ou do centro.
“Santo Amaro tem características peculiares, com uma responsabilidade maior, pois é onde estão os mananciais. Por isso, não olhamos nosso trabalho como uma coisa localizada”, ressalta Cristina Antunes, diretora de relações institucionais da Sajape (Sociedade Amigos dos Jardins Petrópolis e Estados), que engloba o Jardim Flórida e Jardim dos Estados.
Nesse sentido, a entidade conseguiu a instalação de um ecoponto nos baixos do viaduto José Diniz, no cruzamento com a avenida Vicente Rao. O ecoponto é um equipamento da Prefeitura que tem capacidade para receber pequenos volumes de entulho. Cristina também é membro e fundadora da Ciranda, entidade que reúne 13 associações de moradores e que, com recursos do Fundo Estadual de Recursos Hídricos, fará um mapeamento sobre os córregos e das condições de esgoto que são despejados no Rio Pinheiros.
A partir desse levantamento, a associação vai sugerir políticas públicas ao Poder Público para a melhoria do sistema.
Ação ambiental e geração de renda
Já a Cooperativa de Produção, Coleta, Triagem, Beneficiamento de Materiais Recicláveis da Granja Julieta Nossos Valores une ação ambiental e geração de recursos para pessoas de baixa renda ou desempregadas. Tudo começou em outubro de 2003 com um curso sobre materiais recicláveis ministrado na Biblioteca de Santo Amaro e que foi destinado a desempregados, moradores de rua, albergados, pessoas com mais de 40 anos e a maioria tendo estudado somente até a 4ª série do primeiro grau.
Dos 120 alunos, uma parcela decidiu montar a cooperativa, que foi instalada num galpão cedido pela Prefeitura, na rua Professor Alceu Maynard de Araújo. Os integrantes da cooperativa passaram a ir de casa em casa para sensibilizar os moradores a doarem material reciclável, como papel, papelão, latinha, plástico de diversos tipos, ferro e vidro.
O transporte era feito com caminhões cedidos pela Limpurb. “Fomos de casa em casa. Era difícil convencer as pessoas a darem o material, o que só aconteceu quando passamos a ir com freqüência”, lembra a presidente da cooperativa, Márcia Abadia Martins, ressaltando que, atualmente, a colaboração da sociedade é ampla.
Com o material recolhido, os cooperados - a maioria mulheres - fazem a separação, classificação e comercialização para as empresas de reciclagem. Somente a produção de papel chega a 25 toneladas mensalmente. E a renda mensal, que era de R$ 50,00 por pessoa há dois anos, hoje chega a R$ 500,00. “O benefício ambiental é para todos. Talvez não desfrutemos desses benefícios, mas nossos netos irão. A consciência da natureza somos nós”, afirma Márcia.
Estimulada pelos bons resultados, a cooperativa está ampliando o espaço físico para aumentar o número de pessoas trabalhando, especialmente os moradores de rua e albergados, e negocia parcerias com empresas estatais para implantar um cooperativa trituradora de plásticos e PET, visando exportar o plástico granulado.
História
A história de Santo Amaro encontra-se preservada no Museu de Santo Amaro, administrado pelo Cetrasa (Centro de Tradições de Santo Amaro), e que tem como guia Izabel Quintana Helfenstein, uma simpática senhora filha de espanhola e casada com um descendente de alemão – um caso que demonstra bem a presença de imigrantes na região.
O museu é repleto de quadros de Júlio Guerra, o artista plástico nascido na região em 1912, e que conta com uma sala só para seus quadros. “Toda casa bacana em Santo Amaro tinha que ter um quadro do Júlio, porque ele era uma pessoa muito amada”, conta Izabel.
A cultura local encontra-se preservada ainda no Teatro Paulo Eiró, nome em homenagem ao poeta local de maior projeção. O teatro, inaugurado no final dos anos 50 e em plena atividade, possui em frente um painel também dedicado ao poeta.


Borba Gato, o guardião de Santo Amaro
Estátua do bandeirante, implantada na confluência das avenidas Santo Amaro e Adolfo Pinheiro, foi entregue em 1963.
A estátua de Borba Gato, implantada na confluência das avenidas Santo Amaro e Adolfo Pinheiro, divide opiniões desde sua inauguração. A começar pela figura controversa dos bandeirantes, tidos como heróis civilizadores por uns e agentes desagregadores da cultura indígena por outros. Também a solução estética adotada pelo artista instiga os debates.
O escultor Júlio Guerra trabalhou seis anos na execução da estátua. Utilizou trilhos de bondes para a montagem da estrutura de concreto, posteriormente revestida de pedras coloridas de basalto e mármore. O resultado é um mosaico tridimensional com 10 metros de altura e cerca de 20 toneladas. A tarefa mais árdua foi a colocação da cabeça. Pesando três toneladas, teve de ser alçada a mais de 10 metros de altura.
A inauguração do gigante de pedra e concreto integrou os festejos em comemoração do IV Centenário de Santo Amaro em 1963. Além de discursos, Borba Gato foi saudado por um desfile com os tradicionais Romeiros de Pirapora, populares vestidos de bandeirantes, índios e damas antigas, carros de boi e uma canoa como as usadas nas antigas expedições.
Querido por uns, considerado de mau gosto por outros, o velho Borba Gato continua a guardar a entrada de Santo Amaro, alheio às críticas. A estátua do bandeirante santamarense, um dos cartões postais mais famosos da cidade, integra o Inventário de Obras de Arte em Logradouros Públicos da Cidade de São Paulo mantido pelo DPH.
Fonte: Departamento do Patrimônio Histórico
Formigas torradas, uma tradição em Santo Amaro
O costume foi herdado dos índios, e a formiga içá (aquela mais gordinha, conhecida como tanajura) era muito apreciada em farofas e torrada com tempero, um aperitivo que, segundo os moradores mais velhos, cai muito bem com cerveja.
Os santoamarenses prezam as tradições, ainda que esta tradição seja comer formiga, idéia que arrepia os “estrangeiros”. O costume foi herdado dos índios, e a formiga içá (aquela mais gordinha, conhecida como tanajura) era muito apreciada em farofas e torrada com tempero, um aperitivo que, segundo os moradores mais velhos, cai muito bem com cerveja.
Quem mantém este hábito hoje na família do chefe de gabinete é seu sobrinho, o dentista Pedro Luiz Rochel, de 51 anos. Ele espera ansioso pelos meses de outubro e novembro, quando sua casa em Mogi das Cruzes fica infestada pelos formigueiros.
Há duas técnicas para capturá-las: pegando por trás, para não levar uma ferroada, ou então bater de leve nelas com um galho quando levantam vôo. Daí é só tirar as asas e o ferrão e fritar na salmoura.
“É uma delícia, o gosto lembra o do amendoim”, conta. Os fãs mais ardorosos congelam as formigas para poder consumir a iguaria mais vezes durante o ano. Rochel, porém, não conseguiu convencer a mulher e os filhos a experimentar o aperitivo. “Eles se arrepiam”.

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